Aposta farmacológica e cura para COVID-19

        Logo após os primeiros relatos da pneumonia causada por um novo coronavírus em Wuhan na China, em dezembro de 2019, não demorou muito tempo para a infecção assumir uma escala global, resultando na declaração do evento como sendo uma emergência de saúde pública de importância internacional em 30 de Janeiro de 2020 pela Organização Mundial da Saúde (OMS) (GARCIA & DUARTE, 2020). Segundo a OMS (2020), até o dia primeiro de Julho de 2020, foram confirmados no mundo 10.357.662 casos de Covid-19, ao passo em que a corrida por tratamentos efetivos, em paralelo ao desenvolvimento de vacinas eficazes, aquecem a comunidade científica e expõe uma deficiência em educação em saúde da população.

    Fonte: https://news.cgtn.com/news/2020-04-12/Existing-drugs-may-come-in-handy-to-treat-COVID-19-PDalzKOx2g/share_amp.html

        A busca incessante por uma droga capaz de interferir de forma significativa no curso da doença, gera nas pessoas a crença da existência de uma medicação milagrosa. A exemplo, temos o caso da Cloroquina/Hidroxicloroquina, drogas já usadas no tratamento de pacientes com Malária, Lúpus, Artrite Reumatóide e outras doenças autoimunes. A partir de estudos in vitro promissores e resultados preliminares de estudos clínicos com métodos inadequados, levaram a uma distorção da realidade, nos fazendo presenciar o esgotamento desses medicamentos nas farmácias, o uso indiscriminado de medicações com efeitos colaterais importantes e ainda a privação do acesso aos pacientes que já faziam o uso prescrito (NADANOVSKY & SANTOS, 2020).

        De modo semelhante, assistimos a chegada da onda de desinformação a cerca do uso da Ivermectina, segundo Caly et Al (2020), um antiparasitário de amplo espectro, possuidor de efeitos importantes no vírus da Covid-19, o Sars-Cov-2, inibindo sua replicação in vitro. No entanto, possuímos lacunas a respeito do seu uso in vivo, revelando a necessidade de ensaios clínicos com métodos científicos de alta confiabilidade.

        No que diz respeito à eficácia de drogas no processo patológico in vivo, aparentemente, de mais concreto até o momento, contamos com o pronunciamento de pesquisadores vinculados ao grupo de pesquisa RECOVERY (Randomised Evaluation of Covid-19 Therapy) de Oxford, através da liberação de resultados preliminares positivos no início da segunda quinzena do mês de junho de 2020. O documento traz os resultados da avaliação do uso da Dexametasona, um corticóide de baixo custo, em pacientes hospitalizados com complicações respiratórias graves da Covid-19, de modo que, revelou a diminuição de 01 morte a cada 08 pacientes ventilados, ou ainda, a cada 25 doentes apenas com necessidade de oxigênio (RECOVERY, 2020).

    Apesar da euforia pela notícia positiva, é necessário ressaltar a alta capacidade imunossupressora da Dexametasona. Sua utilização é sugerida pela Recovery apenas para pacientes intubados e em estado grave, marcado por um processo inflamatório severo, considerando seu potencial em reduzir a função protetora das células T, redução da capacidade das células B na produção de anticorpos, além de repercussões nos macrófagos e células NK, propiciando a instalação de um estado ainda mais vulnerável (THEOHARIDES, 2020).

    Ademais, dada a conjuntura atual, marcada por incertezas e inseguranças diante o enfrentamento da nova doença, apostar em uma medicação que aparentemente pode lograr efeitos benéficos parece ser um caminho mais confortável a se trilhar que permanecer sem tratamento algum. No entanto, o momento exige de nós a capacidade reflexiva e crítica a respeito da utilização dessas drogas. É essencial separar conteúdo científico com métodos validados de Fake News, além de se alertar quanto ao uso indiscriminado de medicamentos.

REFERÊNCIAS

CALY, Leon et al. The FDA-approved Drug Ivermectin inhibits the replication of SARS-CoV-2 in vitro. Antiviral res., [s. l.], v. 178, n. 2, junho/2020 2020. DOI https://doi.org/10.1016/j.antiviral.2020.104787. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0166354220302011.

GARCIA, Leila Posenato; DUARTE, Elisete. Intervenções não farmacológicas para o enfrentamento à epidemia da COVID-19 no Brasil. Epidemol. Serv. Saúde, Brasília, ano 2020, v. 29, n. 2, 9 abr. 2020. DOI http://dx.doi.org/10.5123/s1679-49742020000200009. Disponível em: 
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2237-96222020000200100. Acesso em: 2 jul. 2020.

NADANOVSKY, Paulos; SANTOS, A. N. Strategies to deal with the covid-19 pandemic. Bras. oral res, São Paulo, v. 34, ed. 068, 19 jun. 2020. DOI https://doi.org/10.1590/1807-3107bor-2020.vol34 .0068. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1806-83242020000100602&script=sci_arttext&tlng=en . Acesso em: 3 jul. 2020

Organização Mundial da Saúde. Folha Informativa - COVID-19 (doença causada pelo novo coronavírus). Opas Brasil, [s. l.], 1 jul. 2020. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875 . Acesso em: 2 jul. 2020
RECOVERY. Low-cost dexamethasone reduces death by up to one third in hospitalised patients with severe. Oxford University News Release. 16 jun. 2020.Disponível em: https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=https://www.recoverytrial.net/files/recovery_dexamethasone_statement_160620_final.pdf&ved=2ahUKEwi7gaunrrHqAhUhDrkGHVCPDKIQFjAAegQIAxAB&usg=AOvVaw0tRWFXZBFv5Inbll-EXGg5. Acesso em: 2 jul. 2020

THEOHARIDES TC, et al. Dexamethasone for COVID-19? Not so fast. ]. J Biol Regul Homeost Agents, [S. l.], v. 34, n. 3. 4 jun. 2020. DOI https://doi.org/10.23812/20-editorial_1-5 Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32551464/#affiliation-3 . Acesso em: 2 jul. 2020.

Texto produzido pelo acadêmico de Medicina José Vinícius de Souza e pela professora Dra. Rafaelle Cavalcante de Lira. 

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