O IMPACTO DO CUIDADO DE CRIANÇAS COM TEA NA SAÚDE MENTAL E QUALIDADE DE VIDA DOS CUIDADORES

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno neurodesenvolvimental caracterizado por déficits na comunicação social e padrões comportamentais repetitivos (Gent et al., 2024). No Brasil, estima-se que cerca de 2 milhões de pessoas estejam no espectro (Secretaria Da Pessoa Com Deficiência, 2023). Sendo assim, o cuidado contínuo dessas crianças gera impactos diretos na saúde mental e qualidade de vida dos cuidadores, especialmente mães, que assumem essa função na maioria dos casos (Vilanova et al., 2022).


Fonte: Getty Images.

Estudos indicam que cuidadores de crianças com TEA apresentam níveis de estresse comparáveis aos de soldados em combate, além de um risco 150% maior de desenvolver doenças cardiovasculares e 200% mais chances de sofrer acidentes (Secretaria Da Pessoa Com Deficiência, 2023). Outrossim, desafios como dificuldades alimentares, comportamento inflexível e alta demanda por terapias impactam significativamente a rotina dos cuidadores (Gent et al., 2024). Por outro lado, apesar da existência da Lei Berenice Piana (Lei 12.764/2012), que garante atendimento especializado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), há dificuldades no acesso a esses serviços, resultando em sobrecarga emocional e financeira para as famílias (Brasil, 2000).

A sobrecarga emocional é uma das maiores preocupações dos cuidadores de crianças com TEA. Pesquisas indicam que mães de crianças autistas apresentam altas taxas de depressão e ansiedade, além de isolamento social significativo (Vilanova et al., 2022). Assim, o acúmulo de responsabilidades sem apoio adequado pode levar a um estado de exaustão física e psicológica, impactando diretamente sua qualidade de vida (Magalhães et al., 2021).

Além do impacto psicológico, a sobrecarga financeira também é um fator crítico. O custo elevado de terapias e tratamentos ultrapassa a capacidade econômica de muitas famílias (Rocha et al., 2024). Embora existam políticas públicas, como os serviços prestados pelos Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSi) e Centros Especializados em Reabilitação (CER), a alta demanda e a falta de profissionais especializados dificultam o acesso ao suporte necessário (Secretaria Da Pessoa Com Deficiência, 2023).

Outro aspecto relevante é a insatisfação com os serviços de suporte, que pode intensificar os níveis de estresse dos cuidadores. Um estudo apontou que a falta de suporte adequado e o difícil acesso aos serviços especializados são preditores de alto nível de esgotamento dos cuidadores (Fong; Mclaughlin; Schneider, 2023). No Brasil, a redução da jornada de trabalho para pais de crianças com TEA, prevista em lei, representa um avanço, mas ainda enfrenta desafios na sua implementação (Brasil, 2000).

Apesar dos desafios, algumas estratégias podem reduzir a sobrecarga dos cuidadores. Intervenções como treinamento de habilidades parentais e terapia cognitivo-comportamental demonstraram eficácia na redução dos níveis de estresse, melhorando a saúde mental dos cuidadores (Settanni et al., 2023). Além disso, a promoção de espaços de lazer e suporte social pode contribuir significativamente para o equilíbrio entre vida pessoal e responsabilidades do cuidado (Davy et al., 2024).

Em suma, o cuidado de crianças com TEA representa um grande desafio para os cuidadores, impactando sua saúde mental, financeira e social. No entanto, o estresse elevado, a falta de suporte adequado e as dificuldades no acesso a serviços especializados aumentam a sobrecarga dessas famílias, tornando essencial a implementação de políticas mais eficazes. Embora existam avanços, como a Lei Berenice Piana e a ampliação de serviços pelo SUS, ainda há lacunas na estrutura de apoio aos cuidadores.
Torna-se evidente, portanto, investir em estratégias de suporte psicológico, financeiro e social, garantindo que esses cuidadores recebam assistência adequada para manter sua qualidade de vida. Com essas ações, será possível melhorar a qualidade de vida dos cuidadores e, consequentemente, o desenvolvimento das crianças com TEA.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Autismo: orientação para os pais. Brasília: Ministério da Saúde, 2000.

DAVY, G. et al. Leisure, community, workforce participation and quality of life in primary and secondary caregivers of autistic children. Autism Research, v. 17, n. 4, p. 1-13, 27 fev. 2024.

FONG, V. C.; MCLAUGHLIN, J.; SCHNEIDER, M.. “We are exhausted, worn out, and broken”: understanding the impact of service satisfaction on caregiver well-being. Autism Research, v. 16, n. 11, p. 1-10, 13 set. 2023.

GENT, V. et al. Investigating the impact of autistic children's feeding difficulties on caregivers. Child: Care, Health and Development, v. 50, n. 1, p. 1-10, jan. 2024.

MAGALHÃES, J. M. et al. Experiences of family members of children diagnosed with autism spectrum disorder. Revista Gaúcha de Enfermagem, v. 42, p. 1-9, 2021.

ROCHA, L. V. et al. Efecto de una intervención cognitivo-conductual en cuidadores de niños con TEA: depresión, ansiedad, estrés y calidad de vida. Ansiedad y Estrés, v. 30, n. 1, p. 1-8, 2024.

SECRETARIA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. Cartilha do autista. Brasília, 2023.

SETTANNI, M. et al. Treatment mechanism of the WHO caregiver skills training intervention for autism delivered in community settings. Autism Research, v. 17, n. 1, p. 1-13, 27 dez. 2023.

VILANOVA, J. R. S.et al. Sobrecarga de mães com filhos diagnosticados com transtorno do espectro autista: estudo de método misto. Revista Gaúcha de Enfermagem, v. 43, p. 1-12, 2022.


Eixo Temático: Tecnologias cuidativo-educacionais para pessoas com necessidades especiais.

Texto produzido por José Fellipe Lima Araruna,  Vivian Lira Ferreira, Maria Amélia Lopes Martins, Kaline Oliveira de Sousa, Maria Fernanda Quaresma, Laísa de Sousa Marques e, sob orientação do Professor Dr. José Ferreira Lima Júnior.

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