“SINDROME DO BRAÇO QUEBRADO TRANS”: DISTANCIAMENTO DO CUIDADO INTEGRAL

Perceber o sujeito nas suas várias dimensões é uma das maneiras interessantes para o alcance da integralidade da assistência, partindo da prerrogativa de que o processo saúde, doença e cuidado geralmente está associado a diversos fatores externos e internos. Dentre os determinantes sociais de saúde, fatores sociais com potencialidade de intervir no adoecimento ou no acesso aos serviços de saúde pelos pacientes, as formas de discriminações direcionadas à orientação sexual ou identidade de gênero podem se apresentar de maneira diversa na prática profissional (GALVÃO, 2021; BRASIL, 2011).


Fonte: Esquerda Diário

Recentemente na literatura surgiu o termo "Síndrome do Braço Quebrado Trans” utilizado para referir à conduta médica de atribuir o problema agudo de saúde apresentado pela pessoa trans à sua identidade de gênero ou como efeito colateral ao processo de transição (CHAZAN; PEREIRA, 2019). A abordagem com perguntas invasivas ou desnecessárias acerca do processo de transição é uma característica que geralmente acompanha esta síndrome (WALL, et al., 2023)

Um terço dos participantes da pesquisa realizada por Wall et al. (2021) reportaram terem passado por situações de atribuição da demanda em saúde a causas relacionadas com a identidade de gênero ou o processo de transição ou ainda receberem questionamentos invasivos e sem vínculo com a queixa apresentada.

Como produto da síndrome do braço quebrado trans, a resolubilidade das demandas diminui uma vez que a investigação é direcionada equivocadamente, dificultando o adequado diagnóstico, além disso, podem ser prescritas intervenções desnecessárias e a interrupção do processo de transição.(CHAZAN; PEREIRA, 2019).

A literatura de maneira recorrente aponta as diversas barreira enfrentadas pela população LGBTQIA+ durante a busca pelo acolhimento a suas demandas em saúde (GARNIER, et al., 2021; BOONYAPISOMPARN, et al., 2023; HAIRE, 2021). Sendo assim, a reestruturação e consolidação de políticas públicas em saúde deve ocorrer em consonância com as novas demandas apresentadas por cada grupo populacional.

Em seu alto potencial de resolução, espera-se que a maioria dos problemas sejam sanados ainda na Atenção Primária à Saúde (APS). Entretanto, para isso, nota-se a necessidade de que a equipe esteja constantemente reciclando seus saberes ao passo que constrói novos conhecimentos, por meio da educação continuada e permanente, não restringindo o cuidado dispensado à população trans somente à atenção especializada, que deve, também, constantemente se atualizar para melhor acolher este público.




REFERÊNCIAS:


BOONYAPISOMPARN, N. et al. Healthcare discrimination and factors associated with gender-affirming healthcare avoidance by transgender women and transgender men in Thailand: findings from a cross-sectional online-survey study. Int J Equity Health 22, 31 (2023). https://doi.org/10.1186/s12939-023-01843-4


Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais / Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Departamento de Apoio à Gestão Participativa.  Brasília : 1. ed., 1. reimp.  Ministério da Saúde, 2013. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_lesbicas_gays.pdf. Acesso em; 23/04/2023.


GALVÃO, A. L. M. et al. Determinantes estruturais da saúde, raça, gênero e classe social: uma revisão de escopo. Saúde e Sociedade [online]. v. 30, n. 2 [Acessado 23 Abril 2023] , e200743. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0104-12902021200743>. ISSN 1984-0470. https://doi.org/10.1590/S0104-12902021200743.


GARNIER, M.; OLLIVIER, S.; FLORI, M.; MAYNIÉ-FRANÇOIS C. Transgender people‘s reasons for primary care visits: a cross-sectional study in France. BMJ Open [Internet]. 2021 Jun 24 [cited 2022 Oct 4]; DOI https://doi.org/10.1136/bmjopen-2020-036895. Disponível em: : https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34168020/.


HAIRE, B.G.; BROOK, E.; STODDART, R. SIMPSON, P. Trans and gender diverse people’s experiences of healthcare access in Australia: A qualitative study in people with complex needs. PLOS ONE 16(1): e0245889, 2021. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0245889


PEREIRA, L. B. C.; CHAZAN, A. C. S. O Acesso das Pessoas Transexuais e Travestis à Atenção Primária à Saúde: uma revisão integrativa. Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, Rio de Janeiro, v. 14, n. 41, p. 1795, 2019. DOI: 10.5712/rbmfc14(41)1795. Disponível em: https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/1795. Acesso em: 23 abr. 2023.


VIOLÊNCIA policial: basta de violência policial contra a população trans negra. Esquerda Diário, 2021. Disponível em: https://www.esquerdadiario.com.br/Basta-de-violencia-policial-contra-a-populacao-trans-negra. Acesso em: 04 de abril, 2023.


WALL, C. S. J.; PATEV, A. J.; BENOTSCH, E. G. (2023). Trans broken arm syndrome: A mixed-methods exploration of gender-related medical misattribution and invasive questioning. Social science & medicine (1982), 320, 115748. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2023.115748


Texto produzido pelo acadêmico de enfermagem Jonathan Pereira de Sousa e orientado pelo Prof. Dr. Marcelo Costa.

 

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