Transtorno de espectro autista: conhecer para atuar


O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é definido pela presença de déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, atualmente ou por história prévia, de acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V)). Sua etiologia ainda é desconhecida, entretanto, a tendência atual é considerá-la como uma síndrome de origem multifatorial, envolvendo causas genéticas, neurológicas e sociais da criança. Estima-se que, atualmente, a prevalência mundial do TEA esteja em torno 70 casos para cada 10.000 habitantes, sendo quatro vezes mais frequente em meninos (VOLKMAR; MCPARTLAND, 2015). No Brasil, apesar da escassez de estudos epidemiológicos que possam melhor estimar os dados nacionais, constatou-se em recente pesquisa que os índices de acometimento pelo autismo são de 27,2 casos para cada 10.000 habitantes (LEVENSON, 2015). O autismo vem sendo “classificado” por graus, que diante destes, podem designar a forma como deve ocorrer o tratamento.


(FONTE: https://www.fasdapsicanalise.com.br/content/uploads/2016/05/filho-696x391.jpg)




Nesse sentido, o autismo grau leve, de acordo com Asperger (1944), resume-se a falta de empatia, baixa capacidade de fazer amizades, conversação unilateral e intenso foco em assunto de interesse especial e movimentos descoordenados. O autismo grau moderado, é um grau mais dependioso, inclusive no parâmetro não verbal, porém, não necessita de tanto apoio como o severo. Por fim, o grau severo consiste em depender de ajuda até nas atividades mais simples, como comer e vestir-se, há uma exclusão do âmbito social, de forma que a criança cria um “mundo próprio”. Por isso, neste último grau, há um índice elevado de dificuldade na fala e também na audição.

A criança com TEA apresenta uma trindade única, que se caracteriza pela dificuldade e prejuízos qualitativos da comunicação verbal e não verbal, na interatividade social e na restrição do seu ciclo de atividades e interesses. Logo, é uma situação que desencadeia alterações na vida familiar devido às necessidades de acompanhamento da criança para seu desenvolvimento. O diagnóstico de uma doença crônica no âmbito familiar, especialmente em se tratando de crianças, constitui uma situação de impacto, podendo repercutir na mudança de hábitos, na readaptação de papéis e ocasionando efeitos diversos no âmbito ocupacional, financeiro e no contexto familiar. Frente ao momento de revelação da doença ou síndrome crônica, a exemplo do TEA, a família comumente perpassa por uma sequência de estágios, a saber: impacto, negação, luto, enfoque externo e encerramento, as quais estão associadas a sentimentos difíceis e conflituosos (EBERT; LORENZINI; SILVA, 2016).

Portanto, nota-se que a revelação diagnóstica do autismo reflete um momento complexo, delicado e desafiador para a família, assim como para os profissionais de saúde responsáveis por essa missão. O ambiente físico associado às demais circunstâncias relacionadas à notícia poderá interferir positivamente ou não para a minimização do sofrimento familiar. Grande parte compete ainda ao profissional de saúde responsável por tal, de modo que a disponibilidade de tempo, diálogo e apoio emocional ainda constituem importantes barreiras para esta atividade que legalmente compete ao médico. Vale salientar a grande importância de uma equipe multidisciplinar, à exemplo de médico, enfermeiro, psicólogo, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, dentre outros a depender da necessidade; afim de partilhar momentos de dúvidas, angústias ou eventuais necessidades que partem do âmbito familiar, tendo em vista que o nascimento de um filho se constitui na formulação de um novo ciclo vital, o qual passa a ser idealizado pelos pais e por toda a família. Entretanto, quando ocorre alguma ruptura nesses planos todos os membros familiares são afetados.

Logo, a expectativa do filho idealizado é frustrada, sendo, a priori, difícil a aceitação, especialmente por parte dos familiares que por ventura se afastam do convívio com a criança. O processo de aceitação do diagnóstico, especificamente por parte dos pais, torna-se mais difícil devido ao desconhecimento acerca da síndrome, o que fortalece a concepção da necessidade de um melhor apoio, atenção e orientação por parte do profissional que noticiará a descoberta do autismo. Muitas vezes, o ambiente independe da relação para com a aceitação do diagnóstico, onde muitas vezes os pais não aceitam e reagem com frieza ou negação.

Dessa forma, compreende-se a importância de que todos os esclarecimentos necessários sejam realizados e que todas as dúvidas dos familiares envolvidos neste momento sejam minimizados e que os profissionais de saúde, numa equipe multiprofissional, saibam implementar estratégias de aceitação.

A despeito do maior conhecimento atualmente sobre o autismo, urge ainda a necessidade do desenvolvimento de linhas de pesquisas nos campos da saúde e da educação para ampliar e qualificar os saberes e fazeres dos profissionais educadores e de saúde, para que estes dêem suporte às famílias, como por exemplo, por meio de núcleos educacionais que estejam preparados e que se aperfeiçoem constantemente para cuidar e educar estas crianças como todas as outras, respeitando suas singularidades. É imperioso o desenvolvimento de políticas públicas verdadeiramente inclusivas, não somente no papel, mas sobretudo no cotidiano das famílias, mormente daquelas socioeconomicamente menos favorecidas.     


Referências:

Volkmar FR, McPartland JC. From Kanner to DSM-5: autism as an evolving diagnostic concept. Annu Rev Clin Psychol. 2014;10:193-212.


Levenson D . Autism in siblings often caused by different faulty genes, study says.
Am J Med Genet A. 2015;167(5):5-14.


Ebert M, Lorenzini E, Silva EF. Trajetórias percorridas por mães de crianças com transtorno autístico. Biblioteca Lascasas. 2016.;9(3):1-21.


BRACKS, Mayana; CALAZANS, Roberto. A questão diagnóstica e sua implicação na epidemia autística. Tempo psicanal.,  Rio de Janeiro ,  v. 50, n. 2, p. 51-76, dez.  2018 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-48382018000200004&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  29  set.  2019.


VILANI, Marina da Rosa; PORT, Ilvo Fernando. NEUROCIÊNCIAS E PSICANÁLISE: DIALOGANDO SOBRE O AUTISMO. Estilos clin.,  São Paulo ,  v. 23, n. 1, p. 130-151, abr.  2018 .


MAPELLI, Lina Domenica et al .
Child with autistic spectrum disorder: care from the family. Esc. Anna Nery,  Rio de Janeiro ,  v. 22, n. 4,  e20180116,    2018 


Texto elaborado pela sublinha de pesquisa Saúde da Infância e Adolescência pela acadêmica de Enfermagem Geórgia Gabriella e pelo Dr. Ferreira Júnior

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